Um simples notebook antigo colocou abaixo a carreira de Cleonice Martinha das Chagas Pereira, ex-interina do Cartório de Paz e Notas de Barão de Melgaço (76 km de Cuiabá). Após a apreensão do equipamento, que havia sido vendido por ela a uma funcionária de outro cartório, vieram à tona suspeitas de uma verdadeira teia de fraudes. Cleonice tentou reverter o afastamento, mas teve o recurso rejeitado pelo corregedor nacional de Justiça do CNJ, ministro Mauro Campbell Marques, no último dia 7 de maio.
A queda de Cleonice começou em abril de 2025, quando ela foi retirada do cargo após um procedimento administrativo revelar uma série de irregularidades no cartório sob sua responsabilidade — entre elas, cobrança acima da tabela oficial, uso pessoal de tributos pagos por usuários e até lavratura de documentos para parentes.
Mas o que realmente escancarou as suspeitas foi o conteúdo explosivo de um notebook que havia pertencido à ex-interina e que, por coincidência, foi parar nas mãos de uma funcionária do cartório do distrito de Cangas, em Poconé (100 km da capital). O aparelho foi apreendido durante uma investigação sobre a atuação clandestina de uma suposta “sucursal” em Várzea Grande, e acabou se tornando uma bomba-relógio para Cleonice.
Dentro do notebook, a Justiça encontrou provas de uma série de práticas consideradas irregulares. Entre elas: registro de óbito fora da sede do cartório, exercício da advocacia — o que é proibido para quem atua em serventia — e intermediação de serviços com cobrança em conta pessoal.
Em sua defesa, Cleonice alegou que nunca foi o alvo principal da investigação e que as provas colhidas seriam ilegais, fruto de uma prática conhecida no Direito como fishing expedition — quando se investiga alguém sem motivo concreto, à espera de encontrar alguma irregularidade por acaso.
Nada disso convenceu o ministro Mauro Campbell Marques. Para ele, as provas foram obtidas de forma legal, ainda que a diligência estivesse inicialmente focada em outro cartório. “Não há ilicitude na utilização de provas relativas à recorrente”, afirmou o magistrado, destacando que a apreensão do notebook aconteceu dentro de um processo legítimo de fiscalização.
Com o recurso negado, Cleonice segue fora do cargo e agora enfrenta as consequências de uma devassa que começou por acaso — e terminou em escândalo.
Jornalista: Mika Sbardelott